A confiança é o cimento das relações humanas. No ambiente corporativo, ela se torna ainda mais estratégica. Sem confiança, líderes não conseguem engajar, equipes não se sentem seguras para inovar e as organizações perdem competitividade. O recente estudo Panorama Gestão de Pessoas – Liderança, realizado pela Sólides em parceria com a Offerwise, trouxe um alerta importante: enquanto 76% dos líderes acreditam que seus times confiam neles, 43% dos colaboradores afirmam confiar apenas em parte ou não confiar em seus gestores.
A discrepância entre percepção e realidade revela uma ferida silenciosa no tecido organizacional. Confiança não é um título “autoatribuído”, é uma conquista diária, construída por interações consistentes, comunicação clara e capacidade de cuidar das pessoas além das metas.
A confiança como fundamento da liderança
Stephen M.R. Covey, especialista em liderança e autor de “O Poder da Confiança” (Ed. Elsevier, 2008), afirma: “A confiança é a moeda da nova economia. É a base sobre a qual todas as relações, sejam pessoais ou profissionais, são construídas.” Quando colaboradores não sentem que podem confiar plenamente em seus líderes, não se trata apenas de uma questão relacional, mas de impacto direto no desempenho da empresa.
Pesquisas internacionais corroboram esse ponto. De acordo com o Edelman Trust Barometer 2023, apenas 63% dos trabalhadores confiam em seus CEOs, índice que oscila globalmente e mostra como o tema é universal. O estudo também demonstra que empresas com altos índices de confiança são mais resilientes a crises e retêm melhor seus talentos.
Comunicação: entre o discurso e a escuta real
O levantamento da Sólides mostra que 63% dos líderes acreditam ser sempre abertos a ouvir suas equipes, mas 59% dos colaboradores não sentem que suas opiniões são realmente consideradas. Essa dissonância ecoa a advertência de Aristóteles, que já na Retórica (Livro II, 350 a.C.) destacava: “Aquele que pretende persuadir deve primeiro conquistar a confiança do ouvinte.” Em outras palavras, falar não é suficiente; é preciso demonstrar que se ouviu.
Na prática, líderes ainda confundem comunicação com emissão de mensagens. O que sustenta a confiança é a escuta ativa e a capacidade de incorporar feedbacks no processo decisório.
Saúde mental e cuidado genuíno
Outro ponto crítico revelado pela pesquisa é a discrepância na percepção sobre saúde mental: 92% dos líderes se dizem confortáveis em abordar o tema, mas apenas 61% dos colaboradores compartilham essa sensação. Em um cenário em que o burnout já é classificado pela OMS como fenômeno ocupacional, esse dado soa como um alerta.
O filósofo dinamarquês Søren Kierkegaard dizia: “A função mais elevada de um líder é ajudar os outros a serem eles mesmos.” Se liderar não é apenas conduzir processos, mas também cuidar de pessoas, ignorar ou minimizar a saúde mental é corroer lentamente a confiabilidade do papel de liderança.
O caminho possível: liderança confiável e humana
Construir confiança não é um projeto pontual, mas um processo contínuo. Alguns pilares se mostram inegociáveis:
1. Transparência: Admitir erros, comunicar decisões com clareza e explicar contextos.
2. Consistência: Cumprir promessas e agir de forma previsível, evitando contradições.
3. Cuidado humano: Colocar as pessoas no centro, reconhecendo suas necessidades emocionais.
4. Escuta ativa: Valorizar genuinamente a opinião da equipe e incorporar feedbacks.
Peter Drucker, referência incontornável na gestão, sintetizou a essência dessa visão ao afirmar em Managing in Turbulent Times, Harper & Row, 1980, que “A confiança é o lubrificante que torna as organizações possíveis”.
Em um momento em que 49% dos colaboradores brasileiros desejam ocupar cargos de liderança, segundo a Sólides, formar líderes confiáveis é mais do que uma necessidade organizacional; é uma exigência cultural. Empresas que compreenderem isso sairão na frente, construindo times mais engajados, produtivos e preparados para os desafios do futuro.

Se liderar não é apenas conduzir processos, mas também cuidar de pessoas, ignorar ou minimizar a saúde mental é corroer lentamente a confiabilidade do papel de liderança.”

Letícia de Freitas e Castro
Jornalista e Mentora de Comunicação Autêntica e de Alta Performance para Líderes.